Enquanto muitos artistas constroem fama divulgando cada detalhe da vida pessoal, duas bandas de metal preferem permanecer nas sombras. Ghost, liderada pelo sueco Tobias Forge, e o coletivo britânico Sleep Token, comandado pelo enigmático Vessel, provaram que anonimato e storytelling podem ser tão poderosos quanto riffs e refrões para conquistar fãs.
No caso de Ghost, a teatralidade é central. Desde o álbum de estreia Opus Eponymous (2010), Forge interpreta diferentes personagens: a cada ciclo surge um novo “Papa Emeritus”, figura com maquiagem de caveira e vestes papais, enquanto os demais músicos assumem o papel de Nameless Ghouls — “subordinados” com máscaras metálicas e sem identidade individual. Cada encarnação do Papa possui uma mitologia própria; Papa Emeritus II, por exemplo, teria sido “demitido” por não conseguir derrubar igrejas e governos. Essa construção de universo, que incorpora símbolos do catolicismo invertidos e rituais de “culto” nos shows, tornou‐se marca registrada da banda. Após sete anos de mistério, um processo judicial levou Forge a revelar sua identidade em 2017, mas a mística permaneceu: novos personagens como Cardinal Copia e Papa Nihil foram adicionados para expandir a saga. Para um Nameless Ghoul, o apelo visual é inseparável da música; ele mesmo reconheceu que a combinação de riffs e iconografia foi decisiva para chamar atenção do público.
Em outro extremo, Sleep Token constrói uma espécie de culto. Formado em Londres em 2016, o grupo mistura tech‑metal, prog, rock alternativo, eletrônica e soul pop de forma única. Nos palcos, os integrantes vestem túnicas e máscaras; são identificados apenas por algarismos romanos, e as apresentações são chamadas de “rituais”. Em entrevista à Kerrang!, Vessel afirmou que “as verdadeiras identidades por trás do Sleep Token são irrelevantes” e que a proposta é permitir que o público se relacione com a arte sem ser obstruído pela identidade do criador. Esse despojamento de ego, segundo ele, cria espaço para que a estética preencha o vazio deixado pela ausência de individualidade. A estratégia funciona: a banda tornou‑se um fenômeno cult, alcançando em menos de uma década o posto de headliner do Download Festival 2025 e lotando duas noites na O2 Arena de Londres.
O sucesso das duas bandas evidencia que, em um cenário saturado de influencers, o segredo pode ser a chave da conexão. Ao esconder os rostos, Ghost e Sleep Token liberam a imaginação dos fãs e criam universos próprios onde música, narrativa e estética se entrelaçam. A ausência de identidade torna‑se, paradoxalmente, um elo forte com o público — provando que, na era da superexposição, o mistério ainda é uma poderosa ferramenta artística.
