Conheça Camille Yarbrough, a voz por trás de “Praise You”

Voz ativa pelos direitos humanos, artista de 91 anos foi revisitada por Fat Boy Slim no maior hit de sua carreira

Quem viveu a adolescência no início dos anos 2000 com certeza foi acometido pelo som de “Praise You”, sucesso do DJ britânico Fat Boy Slim. Quem não, provavelmente ouviu a versão de Rita Ora, “Praising You”, lançada em 2023. Numa sonoridade característica dos anos 90, “Praise You” chamou atenção por conta do clipe de flash mob dirigido por ninguém menos que Spike Jonze e Roman Coppola; e pelos diversos samples que integraram a música.

“Praise You” sampleia riffs das músicas “It’s a Small World” (do Mickey Mouse Disco) e “You Should Be High Love” do Billy Squier, além de conter mais 7 samples creditados nos créditos, incluindo os vocais que compõem o próprio trabalho, que pertencem à Camille Yarbrough, 91 anos, cantora, poetisa e ativista de direitos humanos estadunidense.
Camille nasceu em 1934 na cidade de Chicago, Illinois, e começou sua carreira como dançarina antes de embarcar na música. Na Katherine Dunham Company, que posteriormente tornou-se o Negro Dance Group, Yarbrough viajou pelo mundo durante os anos 50 e 60, período em que a violência – em especial a policial – contra pessoas negras atingia seu ápice.

Quando retornou à Chicago, Camille Yarbrough apostou na escrita como uma forma de protesto, expondo a realidade ao seu redor. Camille também embarcou na atuação e escreveu artigos para o New York Times, um dos maiores jornais dos Estados Unidos, denunciando o racismo no país.

Em 1975, Camille lançou o aclamado disco The Iron Pot Cooker, um trabalho com quatro faixas, entre elas a “Take Yo’ Praise”: “Percorremos um longo, longo caminho juntos, pelos momentos difíceis e pelos bons. Era para ser uma carta de amor aos homens negros.

Escrevi isso durante o que chamavam de ‘o movimento’, quando pessoas de ascendência africana lutavam para tornar o mundo, nosso mundo, um lugar melhor. Nós nos víamos marchando, nós nos víamos sendo espancados. Nós nos víamos sendo forçados à prisão e eu sabia que precisava escrever algo. Eu… eu não conseguia mais escrever sobre os horrores. Então tive que escrever sobre a insurreição”, conta em entrevista à BBC.

Apesar da aclamação pela crítica, a recepção do público foi diferente. Ao South Side Weekly, Camille relatou que o cenário estadunidense não tinha mais interesse em ouvir os protestos da comunidade negra. Ainda assim, ela continuou cantando.

“Artistas negros estavam sendo punidos, porque as pessoas não queriam mais vê-los. Eu continuei fazendo o que podia para conseguir trabalho, mas estava cada vez mais difícil. É só… racismo. E eu continuo dizendo isso. As pessoas querem que eu pare de falar nisso, mas ele ainda está aqui. E naquela época estava bem na minha cara. Eu adoraria ter comprado uma casa bonita para minha mãe, tantas coisas… Não aconteceu”, conta.

A poeta passava por dificuldades financeiras quando chegou a notícia de que o DJ britânico Fat Boy Slim havia sampleado a canção “Take Yo’ Praise”. A voz de Camille ecoava pelas rádios e sua letra era cantada pelas ruas, mesmo que não a reconhecessem de rosto.

“Um dia, eu estava entrando na Bloomingdale’s. Finalmente tinha algum dinheiro, então ia comprar algo. Quando abri a porta, ouvi a música. Comecei a sorrir e olhar para as pessoas tipo: ‘Vocês não me conhecem’. Você conhece a música. Já viveu com ela e de muitas formas a fez sua. E isso é um presente”, declara à BBC.

Aos 91 anos, Yarbrough continua como uma voz potente na luta pelos direitos humanos e por um mundo melhor. Como multiartista, suas obras foram inspiração para artistas de renome, como a cantora Nina Simone, que se declarou admiradora da poeta, além de clubes e organizações que ainda estudam suas obras. Atualmente, Camille Yarbrough vive em um apartamento na cidade de Nova York, Estados Unidos.