Entre os nomes que surgiram na geração mais recente da música independente brasileira, um que tem destoado em todos os aspectos é Mateus Fazeno Rock. O artista, natural de Fortaleza, mistura a crítica social com inovação musical e desponta como expoente na cena sem necessariamente seguir nenhuma tendência específica. O mais novo álbum, Lá Na Zárea Todos Querem Viver Bem, é uma boa representação de como esse artista é tão atual que parece à frente do próprio momento.
O disco é o terceiro trabalho de estúdio de Mateus em cinco anos. O anterior, Jesus Ñ Voltará, foi o que colocou o artista no patamar de nome e ascensão, uma vez que foi um dos álbuns mais elogiados de 2023. Suceder o trabalho que o levou a alçar novos voos era uma tarefa um tanto quanto complexa, mas o novo disco encontra um lugar singular para dar continuidade à trajetória musical do cantor.
Comparado com os outros trabalhos do artista, tanto o antecessor quanto Rolê nas Ruinas, que marcou a estreia de Mateus, Lá Na Zárea Todos Querem Viver Bem é um disco que se apresenta de forma mais expansiva e, um tanto quanto, mais solar. A abordagem do artista parece mais palatável ao público. O disco pode até ser um pouco menos complexo como obra, mas é mais fácil de gostar.
Enquanto anteriormente Mateus parecia um artista experimental, no novo lançamento o traço dos experimentos é menos condicionante para que o público consiga digerir o que está sendo cantado e tocado. O álbum de 2025 é mais fácil. Porém, isso tem que ser visto como uma qualidade e não como um atestado de que é simplório.
Musicalmente, por sinal, Mateus continua experimentando. A mistura do rock, pop, soul, hip-hop, funk e batidas regionais que o fez se diferenciar na cena ganha a sofisticação dos sub gêneros. Há algo de ska, reggae, hardcore, eletrônico, post punk e MPB. Um dos singles de trabalho, Arte mata, é um spoken word com um arranjo que não seria estranho se viesse de uma banda independente britânica, e que provavelmente seria muito mais exaltado entre especialistas se viesse dessa cena.
É visível que há um trabalho de construção de sonoridade constante, mas que não se atém a criar algo que seja reconhecido como um gênero fechado. O músico que levanta desde o início da carreira o conceito de Rock de Favela nessas misturas que faz, apresenta que esse tipo de música é o que a criatividade dele pode entregar para o ouvinte. Nada é engessado, tudo muda de acordo com o processo.
Tematicamente, Mateus também amplia a visão a frase que dá nome ao disco é simples. De onde o cantor veio, todos querem uma condição de vida melhor. Faixa a faixa do álbum os desejos vão sendo explicitados de forma clara. Viver bem é ter objetos materiais, é ter sossego, é ter amor, é ter justiça e é poder sonhar.
Mateus, possivelmente já conquistou parte disso, mas do que adianta se as pessoas da “Zárea” que ele cresceu e não tem a mesma chance. Todo mundo quer viver bem, o desejo do artista é coletivo, o discurso dele é compartilhado, o Rock é da Favela, não só do intérprete que cunhou o conceito. O disco tem um peso narrativo muito mais interessante quando ele é compreendido como um discurso de que Mateus não só não quer, como não pode subir sozinho.
Mateus Fazeno Rock faz algo que só é tratado como estranho ou diferente por quem não conhece. Afinal quem o acompanha percebe que há um vislumbre de futuro na forma como ele enxerga e mostra o próprio trabalho. Lá Na Zárea Todos Querem Viver Bem tanto em som quanto em tema mostra que Mateus não apenas faz um rock próprio, como representa uma criatividade que merece mais voz. Mateus não deve só fazer rock, ele deve fazer sucesso.