Si te quieres divertir: os giros de Bad Bunny e a influência do álbum DeBÍ TiRAR MáS FOToS

Álbum lançado em janeiro projeta o artista em novo patamar no Brasil e abre debates sobre identidade, política e música latina

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Quando estreou o disco DeBÍ TiRAR MáS FOToS, em 5 de janeiro de 2025, não parecia exatamente que o cantor Bad Bunny repetiria o feito de emplacar todas as faixas do projeto no topo das paradas. Talvez, a expectativa de muitos fosse a de ver, finalmente, um desgaste concreto e evidente. Apesar dos múltiplos prêmios e da espantosa atenção que vinha conquistando há anos, seu trabalho anterior não havia empolgado. Nadie sabe lo que va a pasar mañana (2023) soou como um dos álbuns menos entusiasmados de sua discografia, considerado “morno” para as pistas.

No entanto, a ausência de carisma da obra foi recompensada na sequência. Sem singles prévios que pudessem dar pistas a respeito da direção criativa que tomava, a nova empreitada não apenas recolocou o conejo malo no Olimpo das plataformas de streaming, das rádios e, claro, do TikTok, como também reacendeu debates a respeito de sua influência no universo latino-americano. O disco reafirma sua capacidade de escolher expressões sonoras que dialogam tanto com a nostalgia quanto com a urgência contemporânea.

Em DeBÍ TiRAR MáS FOToS, Benito articula sua visão do futuro da música urbana, integrando gêneros que marcaram época a uma linguagem enraizada nas questões sociais e culturais de Porto Rico. Nostalgia e amor se misturam com inquietações políticas e a vontade de promover mudanças concretas na ilha. Quando evoca ritmos afroporto-riquenhos como a bomba e a plena, por exemplo, o artista resgata tradições de resistência que surgiram entre escravizados durante o domínio espanhol.

A salsa também é peça central desse mosaico. Em NUEVAYol, o gênero se funde ao reguetón, evocando o papel da diáspora latina em Nova York dos anos 1960, onde mexicanos, cubanos, dominicanos e guatemaltecos consolidaram a cena latina underground. Bad Bunny, nesse sentido, não apenas revisita memórias musicais, mas transforma sons históricos em veículo de crítica e de identidade, reafirmando raízes em um mercado globalizado.

O peso político do álbum se revela ainda mais no contexto da relação de Porto Rico com os Estados Unidos. Desde 1917, quando o território passou a ser “não incorporado”, os porto-riquenhos convivem com uma cidadania incompleta. As privações e tensões se acentuaram durante o governo de Donald Trump, e, ainda que o álbum não tenha nascido diretamente dessa conjuntura, suas canções caem como resposta. Em narrativas como LO QUE LE PASO A Hawaii, Benito expõe o êxodo da juventude e o sentimento de abandono diante de políticas excludentes.

Essa mistura entre denúncia e poesia também aparece em BoKete, onde o cantor une metáforas amorosas à crítica sobre a precariedade da infraestrutura local, e em TURiSTA, faixa que ganhou ainda mais projeção com a regravação de Laura Pausini. “En mi vida fuiste turista / tú solo viste lo mejor de mí y no lo que yo sufría (Em minha vida você foi turista / Você só viu o melhor de mim e não o que eu sofria)”, canta o porto-riquenho, reforçando a metáfora do turismo predatório e superficial.

Bad Bunny, que desde Yo perreo sola (2020) se consolidou como uma das vozes mais incisivas do debate de gênero na música latina, vai além do entretenimento. “Qual é o propósito de eu estar aqui, nesta posição? O que vem em seguida? Você morre, e isso é tudo… Estava pensando a respeito e disse a mim mesmo: ‘Eu deveria fazer algo para que pudesse plantar uma semente’”, declarou em entrevista ao New York Times, reforçando sua busca por impacto social.

Hoje, ao se distanciar propositalmente do mercado norte-americano — afirmando que não sente falta de se apresentar nos Estados Unidos — Bad Bunny assume o posto de embaixador cultural e linguístico do espanhol. Em um mundo que ainda marginaliza a língua em diversas instâncias, sua música ecoa como gesto político, artístico e identitário.

No momento em que multidões de jovens decoram suas letras e lotam estádios de norte a sul, o porto-riquenho mostra que sua arte é diversão e resistência. Entre batidas que fazem dançar e versos que convocam à reflexão, Bad Bunny segue se firmando como um dos artistas mais revolucionários do presente.